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Execução pela Fazenda Pública em relação ao beneficiário de gratuidade de justiça: Comentários ao enunciado aprovado no VIII Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC)

Por: Carolina Uzeda Libardoni
Advogada (Gordilho, Napolitano e Checchinato Advogados), mestranda em Direito Processual Civil pela PUC/SP, especialista em Direito Processual Civil pela PUC/RJ e em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Estácio de Sá. Professora do curso de Especialização em Direito Processual Civil da PUC/RJ. Membro efetivo do Instituto Brasileiro de Direito Processual.


Nos dias 24 a 26 de março de 2017 foi realizado o VIII Fórum Permanente de Processualistas Civis[1], no qual tive a oportunidade de relatar o grupo para elaboração e revisão de enunciados sobre gratuidade de justiça, petição inicial, contestação, providências preliminares e saneamento[i].

Após muito debate, nosso grupo aprovou – dentre outros três - o seguinte enunciado na plenária: “(arts. 95, § 4º e 98, §§ 2º, 3º e 7º) Para fins da execução prevista no artigo 95, § 4º, aplica-se, igualmente a disposição do art. 98, § 3º”.

O CPC/15, a exemplo do que já acontecia sob a vigência da lei 1.060/50, manteve a suspensão da exigibilidade do crédito decorrente dos ônus da sucumbência pelo período de cinco anos, salvo se “o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade” (art. 98, § 3º).

Isso quer dizer que, muito embora a gratuidade de justiça não afaste a responsabilidade do beneficiário pelas custas e honorários advocatícios (art. 98, § 2º), ele não poderá ser cobrado pela parte vencedora, salvo se houver comprovação da modificação de seu estado de hipossuficiência.

Se o credor tomar ciência de que o devedor, por exemplo, conseguiu um novo e melhor emprego, ganhou um prêmio em dinheiro ou herdou uma fortuna, poderá executar o que lhe é devido, pelo período de cinco anos, bastando que demonstre a alegada modificação da situação fática (requisito para admissibilidade do cumprimento de sentença).

O art. 95, por sua vez, trata do pagamento dos honorários periciais e afirma que quando o pagamento da perícia for de responsabilidade de beneficiário de gratuidade de justiça, ela será paga pelo ente público, “com recursos alocados no orçamento da União, do Estado ou do Distrito Federal”. Ou seja, sempre que aquele que tiver que pagar a perícia for beneficiário de gratuidade de justiça, a responsabilidade pelo pagamento ao auxiliar da justiça será do Estado.

O § 4º do art. 95 afirma ainda que, nesses casos, após o trânsito em julgado da decisão final, o juiz irá oficiar a Fazenda Pública para promover a execução “contra quem tiver sido condenado ao pagamento das despesas processuais”. Trata-se de um procedimento para ressarcimento das despesas do ente público com a realização da perícia, a ser iniciado tão logo seja definido quem restou, afinal, responsável pelos ônus da sucumbência.

O que o enunciado tentou esclarecer foi que essa execução a ser movida pela Fazenda, quando a parte sucumbente for beneficiária de gratuidade de justiça, deve respeitar a disciplina do art. 98, ou seja, só poderá ocorrer se o ente público demonstrar a mudança da situação de hipossuficiência do devedor.

Não é justo, nem isonômico interpretar de forma diferente e liberar a Fazenda da suspensão de exigibilidade para o devedor beneficiário de gratuidade de justiça. Não faria sentido, reconhecida a incapacidade da parte de arcar com o pagamento da perícia, logo após, executá-la cobrando o crédito e invadindo o seu patrimônio. Seria dar com uma mão e tirar com outra, de uma forma muito mais grave e prejudicial.
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