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Inadmissibilidade de recurso extraordinário e especial: Formas de impugnação

Por: Carolina Uzeda
Advogada (Gordilho e Napolitano Advogados), mestranda em Direito Processual Civil pela PUC/SP e especialista em Direito Processual Civil pela PUC/RJ. Professora do curso de Especialização em Direito Processual Civil da PUC/RJ. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual e do Instituto Carioca de Processo Civil.


Problema frequente, que vem atormentando os advogados, após um ano e meio de vigência do CPC/15, é a recorribilidade das decisões que inadmitem recurso extraordinário e/ou especial, prolatadas pelos presidentes e vice-presidentes dos tribunais de origem.

Além, claro, de ainda encontrarmos decisões que fazem referência ao CPC revogado, muitas vezes os fundamentos são confusos e as partes não conseguem, em uma primeira leitura, identificar exatamente quais foram os motivos pelos quais o recurso foi inadmitido. E a questão é de maior importância.

Vejam que o art. 1.030 do CPC/15, alterado pela malfadada Lei nº 13.256/16, traz duas hipóteses de inadmissibilidade dos recursos excepcionais (especial e extraordinário).

A primeira delas, prevista no inciso I, a trata da negativa de seguimento (inadmissibilidade) sempre que o recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o STF não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão em conformidade com entendimento do Supremo, exarado no regime de repercussão geral.

Sempre que a matéria discutida no recurso da parte não tenha repercussão geral reconhecida ou que a tese por ele defendida esteja em desacordo com qualquer decisão sobre mérito de recurso extraordinário prolatada pelo STF sob o regime da repercussão geral, este será inadmitido na origem.

Também é possível, pela alínea b, que o recurso seja prontamente inadmitido sempre que o acórdão recorrido esteja em conformidade com entendimento do STF ou do STJ, no julgamento de recursos repetitivos (aqui podemos incluir também o julgamento de recurso especial interposto contra decisão de Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva[i]).

Em ambos os casos, o § 2º do art. 1.030 afirma que o recurso cabível contra a decisão será o agravo interno.

A segunda hipótese já é antiga conhecida e autoriza, na forma do art. 1.030, V, que o recurso excepcional seja inadmitido, diante do não preenchimento de qualquer outro requisito previsto em lei (intempestividade, ausência de preparo, ilegitimidade, ausência de preliminar de repercussão geral...). Nesse caso, o recurso cabível contra a decisão do presidente ou vice-presidente será o agravo em recurso extraordinário ou especial, conforme o caso.

A parte, então, diante da decisão que inadmitir seu recurso, deverá observar os fundamentos da inadmissão e, a partir daí, identificar se irá interpor agravo interno ou agravo em recurso especial/extraordinário.

Pode acontecer, também, que o recurso seja inadmitido por mais de um fundamento, o que é comum, nos casos de cumulação de pedidos. Por exemplo, é possível que o recurso especial verse sobre (a) validade da cláusula de comissão de corretagem e (b) arbitramento de honorários advocatícios, em valor que a parte entende inadequado. O primeiro fundamento já tem entendimento firmado, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos e há uma grande chance de o segundo esbarrar no óbice previsto na Súmula 7/STJ. O recurso poderá, então, ser inadmitido tanto pelo inciso I, b, quanto pelo V.

Nesses casos, a parte deverá interpor dois recursos. O agravo interno, contra a parte da decisão que inadmite pelo inciso I e agravo em recurso especial, contra a inadmissão pelo inciso V. A interposição de ambos recursos foi a solução encontrada pelo Enunciado 77, do CJF:

Para impugnar decisão que obsta trânsito a recurso excepcional e que contenha simultaneamente fundamento relacionado à sistemática dos recursos repetitivos ou da repercussão geral (art. 1.030, I, do CPC) e fundamento relacionado à análise dos pressupostos de admissibilidade recursais (art. 1.030, V, do CPC), a parte sucumbente deve interpor, simultaneamente, agravo interno (art. 1.021 do CPC) caso queira impugnar a parte relativa aos recursos repetitivos ou repercussão geral e agravo em recurso especial/extraordinário (art. 1.042 do CPC) caso queira impugnar a parte relativa aos fundamentos de inadmissão por ausência dos pressupostos recursais.

Interposto o agravo interno, a admissibilidade e o julgamento ocorrerão no âmbito do próprio tribunal. Já o agravo em recurso especial ou extraordinário, sabemos, tem seu juízo de admissibilidade restrito ao órgão competente para julgamento do mérito.

É possível, ainda, que o agravo interno seja desprovido pelo tribunal de origem. Nesse caso, a parte inconformada com o resultado encontra um grave problema. A doutrina diverge seriamente sobre qual será o recurso cabível. Julia Lipiani, Alexandre Câmara, Eduardo Talamini e Luiz Rodrigues Wambier afirmam que será possível a interposição de novo recurso especial ou extraordinário[ii]. Daniel Mitidiero e Luiz Guilherme Marinoni[iii]defendem que caberá agravo em recurso especial ou extraordinário.

O STJ, porém, vem dando demonstrações de entender pela irrecorribilidade da decisão. Foi o que restou consignado na decisão prolatada nos autos do Agravo Interno no TP nº 473/SP, de relatoria do Ministro Raul Araújo que, por sua vez, chegou a consignar em seu voto que “tratando-se de ato judicial contra o qual não cabe recurso, tem a parte, ainda, via excepcional outra, caso entenda ter tido violado direito próprio”.

A situação de incerteza gerada pelas alterações feitas no texto do CPC/15 pela Lei 13.256/16 é grave e evidente. A parte terá que fazer escolhas difíceis sobre qual via utilizar (ou, até, para se conformar com a eventual irrecorribilidade da decisão) e os tribunais precisarão, com urgência, firmar entendimento sobre qual o meio de impugnação é o adequado, sendo certo que, até lá, o mais prudente é admitir de forma ampla a aplicação do princípio da fungibilidade, não punindo os recorrentes (ou reclamantes, ou impetrantes) pelo erro cometido exclusivamente pelo legislador.

[i] Art. 928. Para fins deste Código, considera-se julgamento de casos repetitivos a decisão proferida em: I – incidente de resolução de demandas repetitivas; II – recursos especial e extraordinário repetitivos.

[ii] LIPIANI, Julia. Como promover a superação dos precedentes formados nos julgamentos de recursos repetitivos por meio dos recursos especial e extraordinário? In: Recursos no CPC/15: perspectivas, críticas e desafios. Coordenadoras Beatriz Magalhães Galindo e Marcela Kohlbach. Salvador : Editora Jus Podivm, 2017, pp. 145/166; CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 3. ed. São Paulo : Atlas, 2017, p. 554 e WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: cognição jurisdicional (processo comum de conhecimento e tutela provisória), volume 2. 16 ed. reformulada e ampliada de acordo com o novo CPC. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 615.

[iii] Comentários ao Código de Processo Civil : artigos 976 a 1.044. v. 16. Coord. Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart, Daniel Mitidiero. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2016, pp. 262/263
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