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Um legado para o futuro

Por: Carolina Uzeda, Marcela Kohlbach e Suzana Cremasco​
 
Quando a Processualistas surgiu, em meados de 2016, nós tínhamos na nossa frente um grande desafio: chamar a atenção para o problema crônico da pequena participação feminina nos ambientes profissionais e acadêmicos relevantes dentro do direito, o que – àquela altura e no que tocava ao direito processual – estava estampado no número reduzido de mulheres então alocadas como palestrantes na programação das Jornadas Ibero-Americanas de Porto de Galinhas.

De lá para cá, a iniciativa recebeu críticas, ganhou elogios, provocou frisson. E – não há como não reconhecer – foi responsável não só por sensibilizar a comunidade acadêmica sobre a necessidade de se preocupar com a inclusão feminina, mas também por revelar inúmeras professoras dedicadas e extremamente talentosas por todo país.

Foi assim que, ainda nas Jornadas Brasileiras de Processo em 2016, algumas professoras começaram a ganhar espaço. Foi assim que o Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBPD) criou o “Projeto Mulheres do Processo Civil Brasileiro” – do qual a Processualistas é o seu veículo oficial de comunicação. Foi assim que, com o Projeto Mulheres, sugiram os “Congressos Mulheres do Processo Civil Brasileiro” – que logo mais em junho chega à sua quarta edição, em Vitória, depois de passar por Salvador, Porto Alegre e Belém do Pará. Foi assim que surgiram os vídeos e ganharam mais espaço as coletâneas de artigos escritos por processualistas do Brasil inteiro. Foi assim que organizadores e comissões científicas de eventos de processo passaram a se preocupar com a importância de incluir mulheres na sua programação.

Embora os avanços tenham sido inúmeros – e inegáveis – os folders com eventos exclusivamente masculinos, o número ainda pequeno de professoras em posição de relevo nos programas de pós-graduação e de mulheres em posição de comando nos ambientes profissionais revelam que ainda há muito o que ser feito, especialmente de modo a romper a fala – injusta e maledicente – de que a busca de igualdade visaria a assegurar, tão só, cotas de participação feminina.

Pensando nisso, já há algum tempo, a Processualistas – e as Processualistas – vêm buscando formas de contribuir para o aperfeiçoamento da formação de estudantes de processo e de criar mecanismos de integração entre meninos e meninas.

Foi tomada por esse espírito que em meados de 2017, a Processualistas apresentou ao Instituto Brasileiro de Direito Processual o projeto de criação de uma Competição Brasileira de Processo, nos mesmos moldes em que, já há algum tempo, vem sendo realizado mundo afora com a Arbitragem.

De fato, competições acadêmicas baseadas na simulação de casos práticos não são, propriamente, uma novidade. Há pelo menos 24 anos, é realizada em Viena, na primeira quinzena de abril, a The Annual Willem C. Vis International Commercial Arbitration Moot (‘Vis Moot’), competição de arbitragem na qual são simulados procedimentos arbitrais que tenham por objeto temas afetos à Convenção das Nações Unidas sobre contratos internacionais de compra e venda de mercadorias. Apenas na edição de 2016, o Vis Moot reuniu mais de 300 equipes de todo o mundo, inclusive equipes de universidades brasileiras, cuja participação nos últimos anos tem se tornado crescente, com o alcance de resultados expressivos e, até então, inéditos.

Inspirada no Vis Moot, em 2010, a CAMARB – Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial-Brasil, criou a Competição Brasileira de Arbitragem – Petrônio Muniz, evento acadêmico que tem como principal objetivo disseminar a arbitragem, estimular seu estudo e contribuir para a formação de profissionais mais qualificados para atuar em arbitragem no país.

Desde a sua criação, a Competição da CAMARB se tornou o maior evento jurídico-educacional de arbitragem da América Latina, sendo que a sua última edição, realizada na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em 2017, contou com a participação de 1500 pessoas, entre competidores e avaliadores de instituições de ensino de todo país – da Universidade Federal do Amazonas à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, passando por todas principais escolas de direito do Brasil.

A participação feminina nas Competições de Arbitragem tem sido, historicamente, destacada, bastando ver que, em 2017, a final da Competição Brasileira de Arbitragem da CAMARB, disputada entre as equipes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), teve quatro oradoras como protagonistas.

A ideia da criação de uma Competição Brasileira de Processo visava a possibilitar que, também no processo, jovens estudantes pudessem se destacar profissional e academicamente e, assim, ganhar oportunidades e espaço.

Ao receber a proposta da Processualistas, o Instituto Brasileiro de Direito Processual se mostrou extremamente aberto à iniciativa, sendo o seu presidente, Prof. Paulo Lucon, e os secretários Ricardo Aprigliano e Ronaldo Vasconcelos grandes incentivadores da sua realização. Uma vez aprovada a proposta da criação da Competição no âmbito da Diretoria do IBDP, desde o primeiro momento, se buscou contar com o máximo de igualdade de participação feminina na Comissão Organizadora – composta por Ricardo Aprigliano, Ronaldo Vasconcelos e Ronaldo Cramer pelo IBDP e Carolina Uzeda, Marcela Kohlbach e Suzana Cremasco pela Processualistas –, no staff da organização – a cargo da Time Comunicação – e na composição dos painéis de avaliadores, que assegurou 42% de participação feminina. Entre os participantes, a inserção de jovens estudantes foi ainda maior e a proporção ficou em 52% de mulheres e 48% de homens.

Para a nossa grande alegria, a final da Competição Brasileira de Processo contou com a participação de uma oradora incrível – Isadora Werneck, da UFMG –, repetindo o sucesso que já se havia verificado com Lívia Losso (UFPR), Bruna Goldenstein (UERJ), Thaís Maia e Larissa Silveira (UFMG), nas semifinais. A estudante Thaís Maia recebeu o prêmio de melhor oradora, ao alcançar a impressionante média de 97,8 pontos na fase classificatória, tendo obtido nota máxima de cinco, dos seis oradores que a avaliaram. Outras nove estudantes de diferentes instituições de ensino foram agraciadas com prêmios ou menções honrosas pelo desempenho que apresentaram na Competição.

A experiência vivida entre os três dias de trabalho da fase oral, realizada na PUC/Rio e no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, os resultados e a repercussão alcançada pela Competição não nos deixam dúvidas acerca do sucesso do projeto, da necessidade de sua manutenção pelos próximos anos e do legado deixado pela Processualistas, com ela, na construção de um futuro melhor.

Ps: Muitas pessoas têm nos perguntando de onde vem a inspiração dos dados constantes no caso da Competição. Foram homenageados a Professora Ada Pellegrini Grinover (Pellegrino S/A), uma das principais entusiastas da criação da Competição. Os membros da Comissão Organizadora Ronaldo Vasconcelos, Ronaldo Cramer e Ricardo Aprigliano deram nome à R3 e Marcela Kohlbach, Carolina Uzeda e Suzana Cremasco à Macasu. O Presidente Paulo Lucon e os Professores Antônio do Passo Cabral e Eduardo Talamini pelo incentivo que deram ao moot compuseram a CATALU, enquanto Ana Marcato, João Lessa e Lia Batista, pela importante participação na revisão do caso, formaram a ANJOLI. As Processualistas Paula Menna Barreto, Trícia Navarro, Luiza Rodrigues, Marcela Perez e Fernanda Pantoja foram responsáveis pela elaboração dos anexos do caso e formaram a empresa de auditoria PATRILU MAFE. A data do Diário (17.09) é a data de nascimento do nosso homenageado, Professor José Carlos Barbosa Moreira. O Município de Córrego das Chuvas, no fictício estado de Vila Rica é, tradicionalmente, onde se passam os fatos da Competição de Arbitragem.50.
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